terça-feira, 19 de junho de 2012
Empresas de transporte priorizam desenvolvimento sustentável
Iniciativas apresentadas na Rio+20 confirmam tendência e especialistas apontam soluções: mais investimentos e respeito à legislação ambiental.
Foto: Gianfranco Beting
A tarde desta terça-feira (19) é histórica para a aviação comercial brasileira. No mesmo horário, às 12h40, decolaram voos de duas companhias áreas diferentes – Azul e Gol – cujas aeronaves foram abastecidas com biocombustível. Nos dois casos, a matéria-prima é renovável, menos poluente e pode ser produzida no Brasil em grande escala. O esforço das empresas confirma uma tendência atual no transporte: a busca pelo desenvolvimento sustentável do setor.
O voo ‘Azul+Verde’ seguiu de Campinas (SP) para o Rio de Janeiro. Produzido a partir da cana-de-açúcar brasileira, o combustível da aeronave foi desenvolvido para apresentar desempenho equivalente ao dos convencionais derivados do petróleo. Uma das preocupações dos pesquisadores foi manter o potencial de redução de emissão dos gases que causam o efeito estufa.
A aeronave da Gol decolou de São Paulo para o aeroporto Santos Dumont (RJ). O biocombustível foi elaborado a partir do processamento de óleo vegetal e gorduras animais para produzir o bioquerosene de aviação. “Nosso propósito é contribuir com o crescimento da aviação aliado a um serviço menos impactante para o planeta”, explica o vice-presidente técnico da empresa, Adalberto Bogsan.
Nos dois casos, o destino escolhido foi o Rio de Janeiro pelo mesmo motivo. A capital fluminense sedia, até 22 de junho, a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável – Rio+20. O transporte é uma das principais pautas do evento porque responde por 25% das emissões de gás carbônico na atmosfera, segundo dados do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma).
“A Rio+20 discute a temática do transporte e da sustentabilidade. Tratamos de soluções e propostas mais efetivas, principalmente para as grandes cidades, onde os problemas de mobilidade são mais intensos. Por meio do contato com entidades internacionais de meio ambiente, energia e transporte, é possível apontar novos caminhos”, destaca o gerente de planejamento da Federação das Empresas de Transporte de Passageiros do Rio de Janeiro (Fetranspor), Guilherme Wilson.
Ao lado da Confederação Nacional do Transporte (CNT), a Fetranspor é uma das entidades mais envolvidas nas discussões sobre transporte sustentável na Rio+20. Uma das iniciativas apresentadas, por exemplo, são os ônibus e caminhões movidos a diesel de cana e biodiesel. Produzidos em parceria com a Mercedes-Benz, os veículos foram aprovados nos quesitos eficácia econômica e ambiental.
"Desde janeiro, temos 20 ônibus rodando com essa tecnologia no Rio de Janeiro, em fase de testes. É cada vez maior a procura das empresas por combustíveis alternativos, menos poluentes. Eles são uma alternativa promissora, que não trazem impacto à matriz tecnológica e os veículos podem operar como saem de fábrica”, explica Wilson à Agência CNT de Notícias.
Outro destaque é o ônibus movido a hidrogênio que não faz barulho e não emite poluentes. Produzido pelo Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/URFJ), o veículo apresenta resultados eficientes em busca da sustentabilidade. Outro diferencial: produz eletricidade a bordo e não precisa carregar as baterias na rede elétrica, como a maioria dos veículos desse porte.
Às empresas de transporte interessadas em se tornar mais sustentáveis, Wilson tem algumas recomendações: “A primeira exigência é o respeito à legislação ambiental vigente, depois a aplicação dos sistemas de gestão voltados à ecoeficiência dos veículos nas garagens”. Segundo ele, as companhias estão mais sensíveis à promoção de investimentos na área.
Para o presidente do Centro de Transporte Sustentável do Brasil (CTS-Brasil), Luis Antônio Lindau, todas as medidas que contribuem para um transporte mais eficiente, com redução da carga de emissão de poluentes nas cidades, são válidas. “Tudo o que puder ser feito, seja para o transporte não motorizado ou para melhorar os veículos e a qualidade dos combustíveis é importante”, acredita.
Ações da CNT
A CNT tem ações voltadas à prática do transporte sustentável. Uma das mais conhecidas é o Despoluir – Programa Ambiental do Transporte -, cujo objetivo é melhorar o desempenho ambiental do setor e transformar os trabalhadores da área - empresários, motoristas de cargas e taxistas - em multiplicadores da educação ambiental.
Até maio de 2012, foi avaliado o nível de poluentes emitidos por mais de 670 mil caminhões e ônibus. Milhares de empresas e caminhoneiros autônomos já foram atendidos. Os veículos com emissões dentro dos limites permitidos pela lei recebem um selo do Despoluir. Se a regulagem dos ônibus e caminhões for feita de maneira correta, eles emitem menos fumaça e gastam menos combustível.
Para o presidente da CNT e do Sest Senat, senador Clésio Andrade, o Despoluir, criado em 2007, tornou-se referência nacional em sustentabilidade. “Nossas ações não se resumem apenas à diminuição da emissão de poluentes. O Despoluir contribui com a propagação da ideia de que uma sociedade com responsabilidade ambiental é um grande legado que deixamos para as gerações futuras”, afirma.
Todo esse trabalho está exposto e à disposição dos participantes da Rio+20. A CNT e o Sest Senat montaram um estande no evento - também foi criada uma página especial sobre o tema - e apresentam aos interessados os principais projetos desenvolvidos para minimizar o impacto da poluição causada pelo transporte. A intenção é incentivar discussões pelo desenvolvimento sustentável do setor.
Lindau destaca a importância dessas ações, mas adverte que a busca por “combustíveis verdes” e veículos menos poluentes não pode ser a única questão quando o assunto é sustentabilidade. “É preciso pensar na gestão do ambiente urbano e no desestímulo ao uso dos veículos individuais. Não adianta produzirmos carros menos poluentes. Precisamos fugir do ‘congestionamento limpo’, que é insustentável”, explica.
Transporte coletivo de qualidade
De acordo com o especialista, a implantação de um transporte mais sustentável está diretamente ligada a quatro pilares: desestímulo ao uso do automóvel; melhoria do transporte coletivo; incentivo ao transporte não motorizado e integração de uso do solo e transportes. Segundo ele, desestimular o uso dos carros não é sinônimo de proibi-los.
Nesse sentido, Lindau afirma que é preciso oferecer um transporte coletivo de qualidade para que a população deixe os veículos na garagem. “O serviço deve propiciar uma rede de alta acessibilidade e conectividade, no entorno dos terminais e em toda a rede. É preciso gerenciar a forma como as pessoas se deslocam”, explica.
Guilherme Wilson, da Fetranspor, concorda. “Com os ônibus do sistema BRT, por exemplo, as pessoas vão migrar de um transporte coletivo de baixa capacidade e velocidade operacional para um modelo de alta capacidade e elevada velocidade operacional. Essa melhoria na qualidade do serviço estimular, inclusive, a diminuição do transporte individual”, afirma.
A medida é uma das mais recomendadas às cidades que estão em busca de um transporte mais sustentável. Enquanto uma faixa viária utilizada por carros dá vazão, em média, a apenas 1.500 usuários por hora, a mesma via, se utilizada pelos corredores exclusivos do BRT, propicia a circulação de um número dez vezes maior.