quarta-feira, 19 de junho de 2013
Os resíduos sólidos e a sustentabilidade
Por Heliana Kátia Tavares Campos
A recuperação dos resíduos sólidos alcançou o patamar de 13% no Brasil - cerca de um terço da meta do Plano Nacional de Resíduos Sólidos para 2031, que é de 45% - e tem provocado degradação humana e ambiental insustentáveis. Nas ruas, nos lixões e mesmo nas Instalações de Recuperação de Resíduos (IRR) registra-se a presença de homens, mulheres e crianças, de forma indigna, catando os resíduos para comercialização ou mesmo para alimentação própria.
Esses catadores, que frequentemente são vítimas de acidentes severos, muitas vezes fatais, são duplamente explorados. Pelo poder público, que não os remuneram pelo manejo dos resíduos sob sua responsabilidade e pela indústria que adquire os materiais recuperados por valores aviltantes. A Política de Saneamento Básico, Lei 11.445/2007, autoriza ao poder público contratar organizações de catadores sem licitação com uso de equipamentos compatíveis com as normas técnicas, ambientais e de saúde pública - mas, como se sabe isso não ocorre.
Por outro lado, a propalada redução da geração priorizada na hierarquização para o tratamento dos resíduos na Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS, Lei 12.305/2010) está longe de ser alcançada. A geração per capita de resíduos no Brasil tende a aumentar. Isto devido principalmente à almejada e alcançada mobilidade social das populações de menor para maior renda. A propensão marginal ao consumo se concretiza gerando mais resíduos. A redução do número de habitantes por domicílio, a entrada da mulher no mercado de trabalho, programas de transferência de renda também influenciam.
Tanto a recuperação dos resíduos secos para sua reintrodução no processo industrial como a compostagem dos resíduos úmidos, são estratégicas no setor. Para que ocorram adequadamente serão necessárias mudanças na gestão nas dimensões técnica, econômica, ambiental e social. A definição sobre os tipos de IRRs necessárias à recuperação de 32% dos resíduos secos e ainda compostagem de orgânicos deve ser estudada caso a caso.
Estudos realizados em IRRs de Guarulhos, Rio de Janeiro e do Distrito Federal demonstram os baixos indicadores de sustentabilidade. Para facilitar a escolha tecnológica e capacidades das IRRs a serem implantadas, apresentam-se os seguintes indicadores:
Geração
Representação
Tecnologia
Porte
Capacidade t/dia
Origem resíduos
Produtividade
kg.catador-1.dia-1
G0
TMA Tratamento Manual no solo
Não aplica
ZERO
Coleta seletiva
95
G1
TMA
Tratamento Manual em Mesa Estática
PP
7
Coleta seletiva
70
G2
TME Tratamento Manual e Semi Mecanizado
MP
Até 30
Coleta seletiva
92
G3
TME Tratamento Manual e Mecanizado
GP
FCSR
Acima de 30
Coleta seletiva
259
G4
TMB Tratamento Mecânico Biológico
GP FCCR
Acima de 30
Coleta convencional e seletiva
235(*)
G5
TMB Tratamento Mecânico Biológico
GP
Acima de 30
Coleta convencional e seletiva
NA
Legenda: PP – Pequeno Porte, MP – Médio Porte (*), GP – Grande Porte. NA – Não aplica. FC – Fluxo Contínuo. SR – Sem Retorno. CR – Com Retorno. (*) O valor de produtividade insatisfatório pela ausência de compostagem em uma unidade.
As baixas produtividades encontradas devem ser em muito aumentadas com melhorias na gestão. Para tanto, há necessidade formalização da relação entre o poder púbico e as organizações de catadores a serem incubadas e a contratação de empresas especializadas para o cumprimento das metas.
O setor industrial deverá, por meio da logística reversa, ressarcir o município das despesas na recuperação das embalagens. Essas atividades aliadas à realização de um acordo entre as três esferas de governo no cumprimento das metas da reciclagem poderão ser as mais importantes conquistas da 4ª Conferência Nacional de Meio Ambiente - CNMA. Aberta a discussão para o todo o país, este evento, que culminará em setembro de 2013 em Brasília, poderá vir a ser o marco divisor de águas para o setor. Eis que um novo horizonte se abre para a gestão dos resíduos sólidos no Brasil.
É preciso avançar em direção a um modelo de recuperação dos resíduos que alinhe a inclusão social com dignidade e respeito à legislação nacional. Que alcance a sustentabilidade técnica, econômica, financeira, ambiental e social e que nos faça orgulhar dos atuais indicadores de reciclagem alcançados e avançar ainda mais. Trabalhamos por isso.
Heliana Kátia Tavares Campos é Engenheira Civil com especialização em Engenharia Sanitária pela UFMG e mestre em Desenvolvimento Sustentável pela UNB. Será palestrante no III GRAL - Conferência Internacional de Gestão de Resíduos na América Latina