segunda-feira, 3 de junho de 2013
Aquecimento global: alarme, sim. Falso, não.
Por Felipe Bottini
A falta de capacidade de acreditar que o Titanic poderia realmente afundar, fez com que as pessoas acreditassem que o navio era indestrutível. Os engenhos promovidos pelo homem até hoje, podem ensejar a perfeição e que estamos em um barco “inafundável”. Mas é nesse ponto que estamos errando. As emissões de gases do efeito estufa e as catástrofes climáticas estão acontecendo e enquanto afundamos, a banda toca como se nada estivesse acontecendo - igualzinho ao filme.
Já que nem eu nem o leitor temos elementos que assegurem a “verdade científica” sobre o tema, façamos uma reflexão com pauta no bom-senso. Podemos extraí-las das informações cedidas por ambos os lados da disputa entre céticos e não céticos - que a propósito trata muito mais de vaidades que de ciência de fato.
Fatos aceitos: Aceitamos os que indicam que na revolução industrial o acúmulo de CO2 na atmosfera era da ordem de 280 partes por milhão. Recentemente foi constatado que o acúmulo ultrapassa as 400 ppm. Isso é amplamente aceito por todos no mundo da ciência climática. Além disso, é amplamente aceito que há aproximadamente 480 mil anos, a concentração era de 180 ppm. Também aceitamos que as partículas de CO2 funcionam como um cobertor que acumula calor sob a atmosfera terrestre, ainda que hajam diferentes interpretações sobre esse fenômeno natural.
Análise dos dados: Desde 480 mil anos até a revolução industrial, a população do mundo pouco evoluiu e não houve alteração tecnológica capaz de produzir emissões em larga escala. Podemos aceitar que o aumento de acúmulo de CO2 até a revolução industrial é o efeito estufa não antrópico, ou seja, não causado pelo homem.
Entretanto, a partir da revolução industrial (menos de 150 anos atrás), o motor a vapor, queima dos combustíveis fósseis e não fósseis, tornou a atividade humana mais do que relevante nesse horizonte. A prova: enquanto em quase 500 mil anos o acréscimo de CO2 na atmosfera foi de 100 partes por milhão (indo de 180 para 280 ppm), nos últimos 140 anos (um piscar de olhos nessa linha de tempos) o acúmulo adicional foi de 120 ppm.
Alarme: Isso quer dizer que em menos de 150 anos conseguimos agregar mais emissões que o que aconteceria naturalmente em 500 mil anos. A aritmética nos diz que aceleramos o processo natural em mais de 3.400 vezes.
Bom-senso: Some em uma receita de bolo 3.400 vezes mais de um dos ingredientes. Acrescente a um processo químico um elemento 3.400 vezes mais do que o habitual. Some ao seu trabalho 3.400 vezes mais broncas do seu chefe. Enfim, o bom-senso diz que a proporção do desequilíbrio que estamos promovendo não pode chegar a um bom resultado. Simples assim!
Trabalho em projetos de redução de emissões de carbono e equivalentes em escala corporativa e nacional há dez anos e estou convencido que as evidências científicas são bastante mais concretas na demonstração do aquecimento global promovido pelo homem que o contrário. Avanços significativos foram obtidos em termos de conhecimento e previsão, mas não precisamos disso para nos motivar a agir de forma sustentável. Somos inteligentes o suficiente para saber que tamanho desequilíbrio não pode promover resultados favoráveis, ainda que não tenhamos condição de avaliar exatamente a extensão do prejuízo. Sabemos que ele virá, aliás, já está vindo.
O IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change), diz que a frequência e intensidade de eventos extremos irão acontecer. Alguns exemplos como o tornado de Oklahoma em maio desse ano ou o furacão em Nova York em outubro do ano passado são eventos que não se esperava que acontecesse em intervalo inferior a 100 anos - mas tem acontecido em intervalos subanuais. Isso sem contar as catástrofes que não são alvo da mídia, como por exemplo, a região do Cunene, no Sul de Angola, que há 12 meses sofreu uma das piores inundações da história recente e esse ano enfrenta uma das maiores secas já registradas..
Já fracassamos em mitigar as emissões como deveríamos. Entretanto, não assumir o erro e negar o óbvio não é honesto com os nossos semelhantes e menos favorecidos. Aceitemos que falhamos até o momento e reiniciemos com força a mitigação e paguemos o preço da adaptação, que certamente não é mais evitável. Já existem refugiados do clima, e não são poucos.
Felipe Bottini é economista pela USP com especialização em Sustentabilidade por Harvard. Fundador da (www.greendomus.com.br) e da (www.neutralizecarbono.com.br) e Consultor especial do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento - PNUD.